(Foto de Eryck Magalhães, Cemitério dos Passos, Guaratinguetá-SP)
Aquela estátua sempre estivera ali, imóvel, fria e cinza. Guardava dela
uma vaga lembrança de infância, quando em dia de finados ia com meus pais
visitar os falecidos entes da família. No entanto aquela foi a primeira vez que
realmente a olhei, ou ela olhou para mim. Não havia ninguém por perto, o
cemitério estava vazio. Apenas eu e ela. Aproximei-me um pouco e pude conferir seus
contornos, os ombros curvados. O cotovelo
sobre uma das pernas servia de apoio para o braço que sustentava a mão cujos
dedos, entrelaçados aos cabelos, amparavam a fronte. Em sua superfície,
principalmente perto dos ombros, havia uma camada de musgo. Num ímpeto a toquei.
Não sei se a intenção era a de confortá-la, acalmá-la ou até mesmo a de
acariciá-la. Enfim, a toquei. O musgo que lhe cobria era como se fosse um manto
de veludo, assim eu o senti com as pontas dos dedos. Por um momento, quase que
senti seu tronco arfar como em um suspiro profundo. Um vento frio passou por
mim. Ajustei meu casaco ao corpo e parti.
Assim como a mulher de Ló, não pude deixar de olhar para trás. Entretanto
a estátua era ela. Não nego que tive vontade de ficar ali, imóvel,
contemplando-a, mas o vento me soprou adiante. Carrego dela esta última imagem
na retina. Às vezes, ela me aparece em sonhos dos quais não me recordo muito
bem. Ela nunca fala, as vestes sempre as mesmas. Seus longos cabelos frente à
face me impedem de admirar suas feições, mas sua energia me atrai feito imã.
Sei que mais dia menos dia vou ter que voltar lá para visitá-la. Não sei
quando. Hei de vê-la e, desta vez, contemplar seu semblante. O rosto, quero ao
menos um esboço de sorriso, a tez de pétala de rosa branca, os olhos
cintilantes. Eu, o anjo e ela, Santa
Teresa. De nós, o êxtase.